Bem bloguistas, meus caros,
Tudo o que eu disse sobre o povo boliviano poderia ser apagado por umas 3 ou 4 pessoas que cruzamos durante a busca de passagens e transporte de nossas motos. A corrupção barata e a malandragem agulha se iniciou em Santa Cruz e só terminou quando cruzamos a fronteira para o Brasil. Enfim, todas as pessoas com quem conversamos pedindo informações, comprando passagens para nós e para embarcar nossas motos, além daquelas com quem tratamos na polícia nacional e aduana na saída da Bolívia desmereceram meu conceito sobre o povo boliviano.
Eu e o Atiê estivemos na Estação Bimodal no domingo, pois abririam das 16h00 até 17h00 para atendimento ao público e venda de passagens. Lá chegando, havia uma fila com umas 30 pessoas e, ao lado, uma outra fila para idosos, gestantes e incapacitados físicos.
Quem esperava comprar passagens para 2ª feira recebeu a mesma resposta do funcionário do guichê, José Luiz Gutierrez (nome que está no ticket): Não há mais lugares vagos. Só para 3ª, mais caras ou para 4ª feira, o mesmo trem. Eu e o Atiê observamos uma camarada magrinho que conversava com o vendedor e informava aos demais sobre a indisponibilidade de passagens para o dia seguinte. Bem, deveria ser um funcionário da ferrovia prestando serviços ao público, pensamos, já que trazia pendurado um crachá da ferrovia, sem seu nome. Fomos a ele e conversamos sobre eventual possibilidade de existir desistências ou alguma outra possibilidade. De pronto disse que poderia conseguir as 2 passagens para nós, mediante um plus no preço. Lembrei-me dos jogos de futebol no Pacaembú ou outro campo brasileiro e os cambistas. A passagem nos custaria 127,00 bolivianos e as conseguimos por 180 bolivianos. Ele queria 200,00 por cada, mas não conseguiu. Disse-nos que se chamava Máximo e assim atendeu quando o chamamos em outra oportunidade.
Deu-nos uma dica com quem tratar no dia seguinte para transporte das motos: Ligou para um amigo de nome Jorge, com quem falei ao seu celular, agendando tudo e nos fomos.
Ainda bem, pois o calor era intenso e aquela estação com teto metálico parecia um micro ondas.
Conversei com o Atiê e como estava próximo do almoço, convidei-o para comer comigo aquele xixão ... he he he... Pensei que ao lhe mostrar ele desistisse, mas o carinha nem se assombrou. Vendo o xixão e o preço, incluindo 500ml de coca cola, ele topou na horinha! Vcs tinham que ver, ele detonou! Bem, ao comer pela segunda vez, já me senti um boliviano... he he he e pedi o xixão com batatas fritas. Estava melhor que o da vez anterior.
Ele foi para seu hotel e eu para o meu, que era ao lado. Marcamos para o dia seguinte, às 08h30, na frente do meu hotel para embarcarmos as motos.
Dia seguinte, 2ª feira, entramos no portão de embarque de mercadoria, no outro portão, mas na mesma avenida e, lá no fundo, encontramos o Jorge que nos esperava. Rapidamente, ele providenciou uma rampa de madeira para subir a escada de uns 15 degraus, pois não há rampas, todo o trabalho é feito por estivadores uniformizados e que recebem dos usuários (nós) uma grana para empurrar as motos escadaria acima e por acondicionar (com papelões) as motos dentro dos vagões.
Chegando o chefe despachante da ferrovia, recebeu o Atiê com carranca, pediu o documento de ingresso da moto na Bolívia (esse documento só interessa à aduana na saída da Bolívia! Não sairíamos da Bolívia com o trem!). O Atiê teve que buscar esse documento em seu hotel, pegando táxi para isso. Claro que já estava impondo dificuldades para vender as facilidades. Não ganhou essa parada conosco! Entregue a documentação, só lhe restou emitir o documento e nos entregar. Minha moto pesou 350km e a do Atiê 250kg. O preço foi de 0,90 bolivianos por kg ou R$ 0,30/kg.
Levamos as motos para a área de embarque, a uns 30m. Ao chegarmos, um policial nacional (tipo polícia federal brasileira), lotado naquela área para narcóticos, tentou de várias formas impedir que as motos fossem embarcadas, alegando falta de documento de trânsito etc e tal. Como o Atiê, que estava com sua moto na dianteira, ficou muito irritado e começou a falar alto com o policial, ele se afastou com o Atiê para "conversar melhor". Não houve negócio, pois todos os documentos estavam legalizados conforme manda o figurino. Ele, muito sem graça, com toda aquela platéia assistindo o achaque, retirou-se sem levar sua grana. Pagamos o Jorge, despachante/estivador, com 100,00 bolivianos pelo esforço nas 2 motos. Elas seriam embarcadas no trem cargueiro das 12h00, na 2ª feira mesmo. Nós tínhamos que estar prontos para o embarque às 15h30, na estação.
Aproveitando o dia, saímos para comprar sobressalentes para a moto do Atiê. Ele acabou comprando uma corrente, um uísque e charutos. Fomos almoçar em um restaurante muito bom do centro da cidade. Depois, passamos no seu hotel para ele fechar a conta e nos dirigimos ao meu, onde, após um banhão frio, me vesti e saí, encerrando a conta.
Atravessamos a avenida, com nossos mochilões nas costas, trombando com aquela multidão que se aglomerava na estação. O calor era intenso e, de pronto, estávamos transpirando às bicas! Pegamos uma fila imensa para passar pela catraca. Novamente, o Atiê estava à frente (o cara é elétrico!) e foi barrado pelo policial nacional da catraca que queria ver seus documentos. De novo, o Atiê reclamou, dando a entender que armaria um barraco no meio de toda aquela gente e o cara o liberou. Enfim, estávamos entrando no trem, com ar condiconado!!!!!
O trem saiu às 16h30 com vários lugares desocupados, "não comprados por fora da bilheteria", enquanto muitos bolivianos, idosos ou não, amargaram 1 ou 2 dias para a compra do bilhete e embarque. Pura safadeza! O Máximo, que nos vendera os bilhetes por fora, foi visto por nós recebendo os documentos dos passageiros na catraca vizinha. Ele estava uniformizado e armado como policial e não funcionário da ferrovia.
O trem, com vários vagões, trafega por uma linha de bitola estreita, igual aos velhos trens brasileiros, puxado por uma antiga locomotiva diesel. Seu corcovear e balanço não lhe permitia imprimir maior velocidade que 60 a 80 km/h, com velocidade média de 40 km/h!!!. Foram 600 km em 15 horas! Os bancos só reclinavam um pouco, impedindo que se encontrasse formas de descansar pernas e braços. Assim que o trem partiu, vi uma dupla vazia e a tomei para mim. Aliviei o Atiê e eu próprio, pois estávamos na mesma dupla. Ambos conseguimos minimizar o desconforto da viagem.
O sistema de ar condicionado é bom e estava setado para 22 graus, todavia o corredor parecia uma avenida, por onde passavam em ambos os sentidos quase todos os passageiros que iam ou voltavam do restaurante e bar. A temperatura, no termômetro digital do vagão, girava em torno de 24... 25 graus. Ainda assim, estava bom o clima.
Por volta das 22h00, o trem parou num "pueblo" ou pequena vila e a impressão que tive era que todos os habitantes estavam lá vendendo alguma coisa. Várias barracas com bebidas e churrasqueiras receberam os contumazes viajantes daquele trem. Cheguei a descer para ver melhor e tudo me pareceu um pouco aquele xixão. Não deu para comer, pelo tempo e pelo aspecto. O Atiê nem desceu do trem. O apito da locomotiva fez com que todos entrassem no trem e, em seguida, seu chacoalhar embalou muitos em seus sonhos bolivianos. Claro, eu e o Atiê não nos incluímos. A viagem foi muito ruim e cansativa, de verdade!
Ao nos aproximarmos do final da viagem, o Máximo (policial) sentou-se na poltrona vizinha do Atiê e começou a trovar um papo de complementação da grana pela compra das passagens. Incrível, o carinha queria mais grana! O Atiê desconversou dizendo não ter mais grana, que precisaria encontrar urgente um banco brasileiro para retirar dinheiro, uma vez que não tinha nem para colocar a gasolina na moto, que fora retirada para embarque. Em suma, o Máximo (em patifaria) saiu de fininho sem levar mais dinheiro. Imaginem se estivéssemos com alguma irregularidade nos documentos pessoais ou das motos! Estaríamos ferrados nas mãos desses "servidores públicos, defensores da lei e da ordem!". O Atiê disse que enviará emails para todas as autoridades que puder na Bolívia, já que ele ficou p......íssimo com esses bolivianos.
Tão logo chegamos na penúltima estação, onde desceu a maioria dos passageiros, o funcionário da ferrovia desligou o ar condicionado e o vagão chegou aos 29 graus centígrados, obrigando alguns passageiros a abrirem suas janelas.
Desembarcamos do trem, na estação de Quijarro, fronteira com o Brasil, por volta das 09h30 e nos dirigimos à área de desembarque de carga. Um funcionário da ferrovia nos indicou o local. Caminhando com nossos mochilões, vimos um vagão estacionado, uma caminhonete encostada de costas para a porta dele, como se nos esperasse. Putz, que tipo de empresa é essa que não desembarca as mercadorias transportadas? Essa é a Ferroviária Oriental SA, da Bolívia.
Alguns estivadores, desuniformizados, se é que podemos chamar a todos com essa qualificação, nos ajudaram a descer as motos do vagão para a caminhonete, uma de cada vez. Quando a 2ª desceu, um deles pediu-nos o documento de transporte das motos, dizendo para acertarmos com o dono da caminhonete e seus ajudantes, pelo trabalho de desembarque.
Eu estava negociando, informando que havíamos pago 50 bolivianos aos estivadores de Sta Cruz quando o Atiê, já enfurecido com tanta cobrança, fez um discurso de que a empresa deveria deixar as motos fora dos vagões, que não deveria pagar mais nada e assim por diante. KCT, eu também sabia disso, mas não era isso que ocorria lá! Tínhamos que pagar e pronto! Precisávamos negociar e acabou ficando por 70,00 bolivianos ambas as motos. Os caras receberam carrancudos, mas não chiaram.
Saímos de lá com as motos e bagagens instaladas, nos dirigindo à fronteira, onde passaríamos pela aduana e polícia nacional. Logo em seguida viria o Brasil.
Chegamos na aduana, entregamos nossos passaportes, documentos das motos e o documento de ingresso das motos na Bolívia. Na aduana, tudo bem, fomos até cumprimentados pelo Natal e nos desejaram boa viagem. Na polícia nacional, que carimba os passaportes, exigiram, ainda, o documento que registrava nosso ingresso na Bolívia em 09/12/2008. O Atiê alegou não ter recebido em Desaguadero, quando entrou na fronteira, vindo do Perú. O policial esboçou uma reação, mas a veemência do Atiê o desestimulou, carimbando seu passaporte. Logo em seguida, entregou-lhe os documentos um outro viajante, mais tímido e o policial logo o enroscou com o mesmo papo. Fiquei impaciente com a demora e o policial logo me despachou também, carimbando meu passaporte e liberando o pobre homem antes de mim.
Trocamos nossos últimos bolivianos por reais e seguimos rumo ao Brasil. Foi uma alegria a minha ao passar pela aduana brasileira, onde fotografei o " Bem Vindos ao Brasil ". Parecia um recado para mim, pessoal!
Bem, entramos no Brasil a tempo de motocarmos um pouco, passando por Corumbá, primeira cidade da fronteira. A moto do Atiê estava sem gasolina e estava difícil de pegar. Procuramos um posto e uma mecânica. Aparentemente, o problema estava na mangueira ou na chave comutadora de entrada de gasolina no carburador. Resolvido (?) o problema, seguimos atrás do posto, onde reabastecemos.
Estávamos no Brasil e exultávamos por isso. Nosso país é imperfeito, formado por homens de todas as origens e qualificações, boas e más. A diferença é que conhecemos o povo brasileiro e qualquer coisa que ocorra aqui não nos surpreenderá em demasia. A cultura, os costumes e as formas de agir de outros homens em outros países são sempre uma incógnita para nós e nossas reações podem ou não dar bom resultado. Daí a cautela ao lidarmos com autoridades locais. Ponto fundamental, para tudo, é estarmos legais com todos os documentos e atentos às artimanhas eventuais que possam nos causar danos.
Amanhã, já em São Paulo, concluirei meu blog após desfazer minha bagagem. Estou curioso para ver minhas fotos e poder incluí-las (algumas mais importantes) nesse blog, dando-lhe mais conteúdo, já que uma imagem vale por mil palavras.
A noite anterior pernoitamos em Aquidauana - MS. Isso fará parte do final de texto do meu blog e, se possível, umas fotos das paisagens verdejantes que fotografei ao cruzar a BR 262, de Corumbá até Três Lagoas - MS.
Estou teclando de Lins, a cerca de 500 km de Sampa, onde chegamos há umas 2 horas. Estamos hospedados no Lins Palace, um hotel de quase 70 anos, com seus quartos grandes, seu saguão enorme com escadaria central em mármore, bem na praça principal da cidade (matriz).
Tudo bem, seu chuveiro é um velho lorenzetti, mas funciona bem... he he he... Afinal, foi o único diponível para nós e estamos pagando cerca de R$ 60,00 a diária por cada quarto com banheiro privativo, ar condicionado e TV a cabo. Não dá para reclamar, né mesmo?
Fiquem com Deus!
Um comentário:
Showwwwwwwwww de bola, Mecca! Uma bela viagem e um relato idem. Poste as fotos assim que possível para que possamos ver o que só imaginamos até agora. Abração!
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